Os raios de sol entravam pela janela da cozinha, e apenas tangenciavam o prato de vidro onde os morangos descansavam, majestosos em seu vermelho molhado.
Do cabelo displicentemente preso na nuca, escapavam umas mechas que lhe caíam sobre o rosto delicado e sobre os ombros nus, deixados a descoberto pela blusa branca. Acompanhava timidamente o bolero que tocava no rádio, cuja fascinação se tornava cúmplice de toda a euforia que a inebriava. Ele estava de passagem pela cidade e faria uma visita breve, apenas para matar a saudade dos beijos e juras de amor. Havia dois anos que se contentava com estes momentos fugazes, os quais se perpetuavam em recordações de risos, olhares, mãos e bocas se envolvendo, se confundindo até se tornarem um só. O cheiro da pele dele se impregnava na sua, e assim permanecia, tenuamente forte até ao próximo encontro.
Picou meia xícara de nozes, e reservou-as a um canto da mesa. Em seguida, com o pensamento transportado à expectativa do encontro e às lembranças que o envolviam, enquanto mergulhava as mãos na água límpida que escorria da torneira, lavou algumas folhas de hortelã, e reservou-as também. Numa panela pequena colocou três gemas, previamente passadas pela peneira, duas colheres (de sopa) de açúcar, uma colher (de café) de essência de baunilha, e uma xícara de creme de leite. Levou ao fogo até ferver, mexendo (sempre no sentido horário, em obediência ao ritual a que se entregava). Despejou serenamente o creme num prato fundo, verde, de porcelana.
Olhou a mesinha no pequeno jardim, coberta por uma toalha branca, e desenhou um sorriso nos lábios. No rádio, o bolero fora substituído por uma rumba que lhe dava cadência aos quadris.
Pegou uma frigideira, derreteu uma colher (de sopa) de manteiga, espalhou por ela os morangos cortados ao meio, acrescentou uma pitadinha de açúcar, esperou dois minutos, e regou-os com meia xícara de conhaque. Inclinou levemente a frigideira para que o fogo fosse atraído pelo álcool, e deixou que as chamas preenchessem toda a área interna do recipiente, flambando os morangos. Deliciava-se com a visão do calor alaranjado, enquanto a espera lhe aquecia a alma, fazendo todo o seu corpo arder de saudade e desejo.
Deitou os morangos sobre o creme branco, mas era para os lençóis brancos e para os prazeres que o aconchego destes lhe proporcionava que escapava o seu pensamento, na companhia do homem que se tornara dono do seu corpo e do seu coração. Polvilhou-os com as nozes picadas e deu um toque final com as folhas de hortelã. Contemplou o prato, envaidecida pela obra-prima que acabara de criar.
O toque da campainha. É ele com certeza! (Na hora certa, porque este manjar precisa ser saboreado ainda quente). Solta os cabelos, segura o coração, e corre para a porta. Não sabe se ri, se chora, ou se permanece em silêncio, mas os seus olhos encontram nos dele e na mala que carrega, a promessa de que esta será apenas a primeira, entre tantas outra manhãs de outono, de uma vida a dois.
Do cabelo displicentemente preso na nuca, escapavam umas mechas que lhe caíam sobre o rosto delicado e sobre os ombros nus, deixados a descoberto pela blusa branca. Acompanhava timidamente o bolero que tocava no rádio, cuja fascinação se tornava cúmplice de toda a euforia que a inebriava. Ele estava de passagem pela cidade e faria uma visita breve, apenas para matar a saudade dos beijos e juras de amor. Havia dois anos que se contentava com estes momentos fugazes, os quais se perpetuavam em recordações de risos, olhares, mãos e bocas se envolvendo, se confundindo até se tornarem um só. O cheiro da pele dele se impregnava na sua, e assim permanecia, tenuamente forte até ao próximo encontro.
Picou meia xícara de nozes, e reservou-as a um canto da mesa. Em seguida, com o pensamento transportado à expectativa do encontro e às lembranças que o envolviam, enquanto mergulhava as mãos na água límpida que escorria da torneira, lavou algumas folhas de hortelã, e reservou-as também. Numa panela pequena colocou três gemas, previamente passadas pela peneira, duas colheres (de sopa) de açúcar, uma colher (de café) de essência de baunilha, e uma xícara de creme de leite. Levou ao fogo até ferver, mexendo (sempre no sentido horário, em obediência ao ritual a que se entregava). Despejou serenamente o creme num prato fundo, verde, de porcelana.
Olhou a mesinha no pequeno jardim, coberta por uma toalha branca, e desenhou um sorriso nos lábios. No rádio, o bolero fora substituído por uma rumba que lhe dava cadência aos quadris.
Pegou uma frigideira, derreteu uma colher (de sopa) de manteiga, espalhou por ela os morangos cortados ao meio, acrescentou uma pitadinha de açúcar, esperou dois minutos, e regou-os com meia xícara de conhaque. Inclinou levemente a frigideira para que o fogo fosse atraído pelo álcool, e deixou que as chamas preenchessem toda a área interna do recipiente, flambando os morangos. Deliciava-se com a visão do calor alaranjado, enquanto a espera lhe aquecia a alma, fazendo todo o seu corpo arder de saudade e desejo.
Deitou os morangos sobre o creme branco, mas era para os lençóis brancos e para os prazeres que o aconchego destes lhe proporcionava que escapava o seu pensamento, na companhia do homem que se tornara dono do seu corpo e do seu coração. Polvilhou-os com as nozes picadas e deu um toque final com as folhas de hortelã. Contemplou o prato, envaidecida pela obra-prima que acabara de criar.
O toque da campainha. É ele com certeza! (Na hora certa, porque este manjar precisa ser saboreado ainda quente). Solta os cabelos, segura o coração, e corre para a porta. Não sabe se ri, se chora, ou se permanece em silêncio, mas os seus olhos encontram nos dele e na mala que carrega, a promessa de que esta será apenas a primeira, entre tantas outra manhãs de outono, de uma vida a dois.
(É permitida a reprodução deste texto, desde que seja citada sua origem e autoria: www.sensibilidadeesabor.blogspot.com; Cris Palavras)
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